Avançar para o conteúdo principal

Mensagens

A mostrar mensagens de novembro, 2013

Hoje

apetece-me vestir abraços.

Em legítima defesa

                Duarte Belo Sei hoje que ninguém antes de ti morreu profundamente para mim Aos outros foi possível ocultá-los na sua irredutível posição horizontal sob a capa da terra maternal Choramo-los imóveis e voltamos à nossa irrequieta condição de vivos Arrumamos os mortos e ungimo-los São uma instituição que respeitamos e às vezes lembramos celebramos nos fatos que envergamos de propósito nas lágrimas nos gestos nas gravatas com flores e nas datas num horário que apenas os mate o estritamente necessário mas decerto de acordo com um prévio plano tu não só me mataste como destruíste as ruas os lugares onde cruzámos os nossos olhos feitos para ver não tanto as coisas como o nosso próprio ser A cidade é a mesma e no entanto há portas que não posso atravessar sítios que me seria doloroso outra vez visitar onde mais viva que antes tenho medo de encontrar-te Morreste mais que todos os meus mortos pois esses arrumei-os festejei-os enquanto a ti preciso de matar-te dentro

Anatomia de vontades

UM AMOR A proximei-me de ti; e tu, pegando-me na mão,  puxaste-me para os teus olhos  transparentes como o fundo do mar para os afogados.  Depois, na rua,  ainda apanhamos o crepúsculo. As luzes acendiam-se nos autocarros; um ar diferente inundava a cidade. Sentei-me nos degraus do cais, em silêncio. Lembro-me do som dos teus passos, uma respiração apressada, ou um princípio de lágrimas, e a tua figura luminosa atravessando a praça até desaparecer. Ainda ali fiquei algum tempo, isto é, o tempo suficiente para me aperceber de que, sem estares ali, continuavas ao meu lado. E ainda hoje me acompanha essa doente sensação que me deixaste como amada recordação. Nuno Júdice, 'A Partilha dos Mitos'